sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Entrevista: Playboy

Uma conversa franca com o mais encrenqueiro dos repórteres do CQC sobre suas constantes brigas com políticos, confusões no Twitter, piadas sem graça, transas com fãs e o dia em que viu a filha do pastor pelada
 
 


   Quem vê a cara de pau de Danilo Gentili no CQC, na Band, nem sequer imagina que por muito pouco o sujeito, apontado como uma das grandes revelações do humor nacional, não virou pastor evangélico. Freqüentador assíduo da Igreja Batista durante a adolescência, Gentili conta que levou a sério a ideia de se dedicar à pregação. Sua carreira no púlpito, no entanto, não prosperou. Antes de se entregar à vocação, ele foi expulso da congregação. Seu problema: questionar práticas institucionais da igreja, como o recolhimento do dízimo. “Cansei daquela palhaçada e fui ser humorista”, costuma repetir.
Filho de um técnico de máquinas de escrever e de uma dona de casa, Gentili nasceu em 27 de setembro de 1979 e cresceu na periferia de Santo André, no ABC paulista. Formado em publicidade na UniABC, começou a fazer participações em shows de humor stand-up em 2006 com o grupo paulistano Clube da Comédia. Foi numa dessas apresentações que chamou a atenção de um dos produtores do programa CQC, que o convidou para encarnar o “repórter inexperiente”. Sua missão era sabatinar celebridades como se fosse um estagiário inseguro e despreparado. Deu certo, e sua atuação, que deveria durar dois meses, acabou lhe garantindo vaga no time fixo de repórteres-humoristas do programa comandado por Marcelo Tas. Logo na estreia, Gentili foi expulso do Congresso Nacional por fazer perguntas consideradas inconvenientes. Provocar políticos virou sua especialidade.
Atualmente, Gentili divide seu tempo entre as gravações do CQC e sessões sempre lotadas de seu show solo de comédia stand-up, Danilo Gentili Volume 1. Sozinho no palco, ele arranca gargalhadas e aplausos da plateia desfiando uma sequência de piadas inspiradas em situações cotidianas, como viagens de avião, filas no banco e relação com a exnamorada. No fim do ano passado, publicou seu primeiro livro, Como Ser o Pior Aluno da Escola (Panda Books), inspirado, ele garante, em suas próprias experiências. Embalado pelo sucesso, até o fim deste ano deve inaugurar, em sociedade com o parceiro de CQC Rafinha Bastos e o produtor Ítalo Gusso, o bar Comedians, em São Paulo, cujo projeto é abrir espaço para novos talentos do humor.
Para esta entrevista, a repórter Camila Gomes encontrou-se com Gentili em duas ocasiões. A primeira, a pedido dele, na cafeteria Starbucks, no bairro dos Jardins, em São Paulo. No segundo encontro, o humorista recebeu a repórter no apartamento de um quarto em que mora no bairro da Bela Vista. A decoração (ou a falta dela) entrega que ali vive um homem solteiro. Entre os poucos móveis há uma cama de solteiro, um sofá e uma televisão gigante na qual Gentili assiste a seriados e aos desenhos favoritos, Os Simpsons e Family Guy entre eles.
Vestindo calça jeans, tênis e uma camisa preta na qual faltava um botão, Danilo respondeu, com seu característico sotaque do ABC, a todas as perguntas. “Eu sou o cara chato que enfia pergunta goela abaixo de todo mundo, então não posso me dar ao luxo de fugir de pergunta”, explica. Danilo tem se notabilizado nos últimos tempos por protagonizar polêmicas no Twitter – em que tem quase 1 milhão de seguidores – e na televisão. No dia anterior à entrevista, por exemplo, o humorista havia sido agredido por militantes do PT num evento de campanha da candidata Dilma Roussef em Santo André. Coincidência ou não, cada vez que Gentili apanha em rede nacional a audiência do programa sobe vertiginosamente. Tiradas que variam da piada pronta à fina ironia pontuam as histórias do humorista, cuja voz fina e quase estridente contrasta com seu 1,92 metro de altura.
Toda segunda-feira tem alguém tomando porrada no CQC. Você, em especial, virou saco de pancada nas últimas semanas, e cada vez que isso acontece a audiência sobe. Essa fórmula não virou uma armadilha para vocês mesmos?
Pois é, acho que foi uma grande coincidência. Recentemente, a Mônica [Iozzi, repórter do programa] foi agredida, e eu, nas últimas semanas, também. Mas o CQC tem quase três anos de vida e não é sempre que acontece esse tipo de coisa. A única explicação que eu tenho é que as eleições estão chegando e os caras ficam meio alterados… Político que não quer ficar mal na fita, os militantes ficam exaltados. Isso gera mídia e audiência, sim, mas eu não saio para as reportagens pensando em arranjar briga. E não é essa a imagem que eu quero ter. Isso é ruim pra mim, não é legal.

Mas, ainda assim, você é quem mais apanha…

Dizem que é porque as pessoas ficam com raiva de mim por eu ironizar muito. Por exemplo, se vou fazer uma entrevista e a pessoa me xinga, não vou cobrar respeito, não vou falar “Você me xingou. Cadê a sua educação?” Não dou sermão, respondo na mesma moeda.
Como assim?
Por exemplo, recentemente fui fazer uma reportagem em Analândia (SP). Estava vestido com um figurino diferente, uma roupa de flautista, e o chefe de gabinete do prefeito começou a me chamar de boneco. “Você é boneco, você é boneco!”, ele falava. Aí eu disse: “Então você é boneca”. E ele era meio afeminado mesmo. O cara ficou puto e chamou a gente pra conversar num outro lugar, na sala dele. Quando chegamos no corredor, começou um tumulto, parece que foi uma arapuca, e arrancaram a câmera do cinegrafista, me jogaram dentro de uma sala, e o cara começou a me bater.
O chefe de gabinete do prefeito bateu em você?
É, e ele batia assim [imita soquinhos no ar]. Mas não doeu. Ele é louco, maluco. Quando a gente chegou com a câmera, ele falava: “Podem gravar, eu adoro ser gravado!” E fazia assim [põe a língua para fora, de maneira sensual]. Acredita?!? Desequilibrado! Esse é outro motivo pelo qual eu apanho: eu mexo com os políticos. As perguntas que faço não são gracinhas. Pergunto o que quero saber de verdade. Não sou repórter, não sou ator. Eu me considero uma pessoa normal com essa função, e minhas perguntas são as mesmas que uma pessoa normal indignada faria.
Mas são provocações…
Pois é, às vezes. O tom é ácido, mas não faço provocação de graça. Vou lá e vejo que tem um esgoto a céu aberto e o cara que dinheiro para arrumá-lo não fez nada. Isso pra mim é uma provocação!
Mas será que, com essa história de enveredar para o jornalismo de denúncia, o CQC não corre o risco de cair na vala do populismo barato?
Tipo Aqui e Agora?
É, tipo Ratinho. Você quer ser o novo Celso Russomanno?
Não, jamais. Na verdade, o Proteste Já é um quadro que eu acabei fazendo porque o programa precisou. Acho que o quadro tem seu valor, mas nem é o meu preferido. Não quero ser o Celso Russomanno. Sou humorista acima de tudo.
Você acha que esse quadro tem graça?
Não. O Proteste Já não é feito para ter graça. Ele é um quadro-denúncia e corre o risco de virar populista, sim. Mas o CQC não corre o risco de virar um Ratinho porque essa é uma parte muito isolada do programa.
Já que apanhar virou quase rotina, quando foi a última vez que você bateu em alguém para variar?
Foi há uns dois anos, quando joguei o microfone na cabeça de um fotógrafo. A gente estava numa favela, fazendo uma reportagem, na época da eleição para prefeito. Estávamos acompanhando a Marta Suplicy. Os militantes do PT não queriam que a gente chegasse perto, e um fotógrafo da equipe dela começou a incitar os militantes contra a gente. Ele falava umas coisas do tipo: “Enfia o dedo no cu dele!”
Alguém enfiou?
Muitos, vixe! E eu deixava enfiar, vou fazer o quê? Era muita gente, não dava pra impedir.
Foi a primeira vez que isso aconteceu?
Foi, foi. Quer dizer, em público e a céu aberto, foi. [Risos.] E aí esse cara mandava os militantes enfiarem o dedo no meu cu, me chutar, e foram fazendo isso. Quando terminei, fui tirar satisfação. “Que é isso? Eu tô trabalhando aqui igual a você!” Comecei a discutir, ele começou a falar merda, e eu fui pra cima dele. Nisso, vieram três caras e me levaram pra longe. Meu câmera, que é um cara forte, viu e foi pra cima do fotógrafo, que pegou a câmera e começou a tirar foto dele. Achei muito cuzão! Essecara faz o que fez e, quando o cara vai pra cima dele, ele vai tirar fotinho? Eu já estava longe, mas queria impedi-lo de tirar foto, então joguei o microfone na cara dele. Machucou pra caralho, depois saiu no jornal [em O Globo]. Daí os caras vieram pra cima da gente, mas nisso apareceu o motorista da van e a gente partiu. O senador Eduardo Suplicy [PTSP] encontrou a gente ali perto, e fomos todos pra delegacia fazer um BO. Um ano depois, encontrei o fotógrafo. Nós conversamos, pedimos desculpas, e eu dei uns convites pra ele ver o meu show.
Você foi repreendido por isso no CQC?
Sim. É claro que essa não é a postura que eu quero ter nem a que eles querem que os repórteres tenham. Mas eles, ao mesmo tempo, entenderam. Eles já trabalharam na rua, sabem que é uma situação-limite.
Quantos processos você tem?
Não sei, porque uns foram pra frente e outros não. Acho que uns quatro ou cinco.
Quem já abriu processo contra você?
O [deputado do PR-MG] Edmar Moreira, por calúnia e difamação, porque eu falava que ele tinha um castelo e tal. Mas tem outros, não lembro. Não levo processos pra frente. Só quero conseguir terminar minhas reportagens e ir embora. Se tem um processo sendo levado adiante, isso é com a Band, e eu só fico sabendo quando o advogado de lá me chama para assinar algum papel. Mas, quando reclamam por uma coisa que eu fiz fora do CQC, a Band não se mete. Esses dias chegou uma ameaça de processo da Luciana Gimenez aqui em casa.
Ela ameaçou processar você por quê?
Porque um dia desses foi algum político no programa dela e eu escrevi no meu Twitter: “Sou contra políticos irem ao SuperPop. Aquele programa é conhecido por putas darem seus depoimentos. Não seus filhos”. Daí ela mandou carta dizendo que iria me processar se eu não me desculpasse publicamente. Não vou me desculpar por fazer piada.

Você já se desculpou por alguma piada que fez?

Uma. E só porque não foi consciente. Encontrei a [cantora] Pitty no Grammy Latino há uns três anos. Era ao vivo, e eu não sabia o que perguntar para ela. Disse o que me veio à cabeça: “Você não tem medo de que seu filho seja chamado na escola de ‘son of a Pitty’?” Uma piada idiota. Ela ficou sem graça, e aí o produtor me chamou de lado e falou: “Velho, ela perdeu um filho esses dias”. Esperei chegar em casa e mandei um e-mail pra ela me desculpando e dizendo que não sabia. Ela não respondeu, mas eu mandei.
Com a polícia, você já teve problemas?
A primeira vez foi quando eu tinha uns 12 anos e estava saindo do estádio fazendo baderna. Estava no meio da [torcida] Gaviões da Fiel. Levaram todo mundo pra delegacia, mas liberaram logo depois.
Você é da Gaviões?
Não, mas já fui fanático por futebol, de brigar em estádio, sair no jornal. Hoje sou totalmente neutro. Se você me perguntar para quem eu torço, vou dizer que é o Corinthians, mas consegui me desinteressar totalmente de futebol. Perdi o interesse naturalmente, achei que era perda de tempo.
Antes de fazer reportagens em Brasília, você já se interessava por política?
Já, já lia o caderno de política no jornal, por exemplo. Comecei fazendo show em bar e tentei fazer material de comédia stand-up com política, mas ainda é difícil. O público só ri do que entende, não é politizado. Se eu falar que o Lula não tem um dedo, todo mundo dá risada, mas, se eu falar sobre a aliança dele com o Sarney, os caras não entendem. Mas você não tem de descer ao público, eles é que têm que subir até onde você está. O desafio é esse.

Isso não soa meio arrogante?

Não. Do que o público gosta? Mulher pelada no Zorra Total. Eu posso ser muito popular fazendo isso, mas não é isso o que eu quero. Então, de certa a forma a habilidade é conseguir tornar acessível o que eu quero dizer. Não que o público seja burro, mas eu não consegui fazer isso ainda, tornar algumas coisas que eu quero falar mais acessíveis.
Você votou no Lula?
Não, não votei em ninguém.
Anulou?
Anulei. Nas últimas eleições, nas penúltimas, nas antepenúltimas. E cogito anular de novo. Porque não tem ninguém em quem votar e porque não acredito que quem ganhar vai ser tão diferente. Eu não vou votar na Dilma sabendo que o vice dela é o [Michel] Temer, que o Sarney é aliado. Eu não vou votar no Serra sabendo que o Quércia é aliado do cara. E eu odeio aquele discursinho de que não pode votar nulo porque assim você está dando voto pra outro candidato. Isso vai acontecer com qualquer voto! Muita gente diz que, se você votar nulo, depois não pode ficar puto. Claro que eu posso ficar puto! Porque as atitudes do presidente vão me afetar mesmo se eu não votar nele. Inclusive, eu tenho mais direito de ficar puto do qualquer um porque eu não escolhi o cara. Se for assim, se a Dilma ganhar, o cara que votou no Serra não pode ficar puto com ela? E eu odeio ser obrigado a sair pra votar. Isso não é democracia.
Como é a sua relação com os candidatos?
O Serra é uma incógnita. Tem dias em que ele está feliz da vida e tem dias em que dá patadas em todos os jornalistas, mas daí não é comigo, é com todo mundo. A Dilma agora não está falando com ninguém porque ela está na frente das pesquisas. E a Marina Silva é simpática, a mais receptiva, não foge de nenhuma pergunta. Por enquanto é assim. Se a Dilma começar a perder, aí ela vai ser amigona pra caralho, vai responder tudo.
Qual é o político mais bizarro que você já encontrou?
Em cada área tem um. Político bizarro é o que não falta. O Zé Dirceu, por exemplo. Olha o histórico do cara: guerrilheiro, militante do PT e tal. E, quando chega aonde lutou a vida inteira pra chegar, o que ele faz? Mensalão! É o cara que fez a cagada. E que continua sendo um dos cabeças do PT. Isso, pra mim, é muito bizarro. E esse cara, sendo um político, tem tanta certeza de que não vai acontecer nada com ele que nem na frente da câmera ele tenta fingir ser uma coisa boa, entendeu? A opinião pública não tem valor algum! Quando o [deputado do PTB-RS] Sérgio Moraes disse que estava se lixando para a opinião pública, ele falou isso no microfone no Congresso Nacional, na Câmara dos Deputados, em Brasília. Um deputado subiu no púlpito pra falar isso! Depois, quando eu digo que voto nulo, tem gente que vem me dizer que estou deixando o Brasil na mão de todo mundo. Não! Eles é que estão deixando o Brasil na mão de todo mundo. É muita gente burra, cara.
Os políticos têm medo de você?
Você acha que eu posso fazer alguma coisa contra um político? O que eu posso é fazer um monte de gente tirar sarro deles durante algum tempo, um monte de gente mandar e-mails enchendo o saco. O ego de um coronel é muito inflado, então, se eu falo alguma coisa na cara dele, ele vai ficar uns dias puto comigo, vai pensar no travesseiro: “Moleque filho da puta, quem é ele pra vir me falar isso, quando na minha cidade todo mundo me respeita e tem medo de mim?” Mas não passa disso.
Você tem inimigos?
Deve ter muita gente que não gosta de mim e que está torcendo para eu me dar mal, mas não acho que tenha alguém que vá sentar e maquinar um plano maquiavélico pra me derrubar. Acho que não tenho inimigos nesse nível.
A que você atribui a ignorância de alguns políticos que entrevista no Congresso?
O negócio é que político brasileiro não precisa provar que é competente. São pouquíssimos os que são eleitos por causa disso. O que eles precisam é do curral eleitoral deles. Se eles dão esmola pro curral, não precisam ligar para o que acontece no mundo.
Você já foi agredido por militantes do PT em duas ocasiões. O que eles têm contra você?
Não é contra mim, é contra todo mundo que questione. Eles acham que são perseguidos, que estão na Inquisição. É como uma religião. Se eu falar entre eles que o Zé Dirceu é o cara do mensalão, que os enganou, eles vão gritar: “Cala a boca! Você não pode falar isso aqui!” É igual a você ir no meio de muçulmanos e falar alguma coisa contra eles. É fanatismo, entendeu?
Seu companheiro de emissora José Luiz Datena disse à PLAYBOY, no mês passado, que acha a Dilma Rousseff “um tipão”. Você concorda com ele?
Um tipão? [Risos.] É, é um tipão mesmo! Que podia fazer uma dieta e virar um tipinho. O Datena tem um gosto bizarro.
Você era criança quando Marcelo Tas encarnava o repórter satírico Ernesto Varela. Vocês são uma versão dele?
Claro. O que ele fazia tinha ainda mais valor do que o que a gente faz hoje porque começou na época da ditadura. Se hoje eu vou entrevistar um cara e ele pode me bater, na época do Varela ele poderia morrer. Ou ser torturado, sei lá. A linha era muito fina. O que a gente faz é uma novidade porque apareceu renovado depois de muito tempo sem algo desse tipo.
O Tas é muito exigente com vocês?
Não, ele nos deixa bem livres pra fazer as coisas do nosso jeito. No sábado passado, por exemplo, me mandaram para o Rio para fazer reportagem de celebridade, e eu fiquei puto porque odeio esse tipo de coisa. Cheguei lá e vi que a Preta Gil estava lá. Daí inventei de ela se vingar de mim porque ela sempre reclama das piadas que eu faço sobre ela. Foi uma ideia que eu tive na hora e deu certo. A gente tem liberdade pra fazer, e ficou legal.
Você adora fazer piada sobre a Preta Gil, mas fala sério: se ela te desse mole, você pegaria?
A Preta Gil? [Longo riso.] Não, eu tenho pela Preta Gil todo o respeito, pra mim ela é como uma irmã [irônico]. Mas, falando sério, ela recebeu a gente com muita atenção, foi muito gentil.
O Marco Nanini, em entrevista à PLAYBOY, disse que fica muito desconfortável se alguém do Pânico ou do CQC se aproxima para entrevistá-lo porque ele sabe que vão debochar dele. O que você acha disso?
Acho que as pessoas têm de parar de se levar tão a sério. Eu já encontrei o Marco Nanini uma vez, estava vestido de CQC, e não o entrevistei, pedi para tirar uma foto com ele. Não dá pra se levar tão a sério. Eu não tenho nada contra alguém me entrevistar e debochar de mim.
O que você aprendeu com Marcelo Tas?
Acho que ele tem uma coisa que eu não tenho e que é fruto da experiência dele: ele faz as coisas com muita sutileza. No CQC, ele fala o que quer, mas de forma sutil, com muita categoria, sem que fique feio. Eu sou mais grosseiro. Acho que preciso aprender isso com ele.
Em época de eleições, o horário político fica cheio de candidatos fazendo gracinhas e frases de efeito. É concorrência desleal esse tipo de humor?
Eles fazerem gracinha na campanha, tudo bem. O problema é quando eles fazem gracinha depois de eleitos. Mas sabe que os presidentes americanos há décadas têm uma equipe de humoristas pra acrescentar piadas aos discursos deles?

Você acha que o Lula precisaria de uma equipe dessas?

Pois é, eles têm uns humoristas que sugerem: “Se você fizer tal piada aqui, pode ser legal”. O Lula já meio que faz isso porque ele sempre fala umas coisas engraçadas. O humor é popular, ninguém consegue ter raiva de quem te faz rir.
Quando pensa no seu salário hoje em dia, você dá risada?
Hoje eu posso dizer que ganho bem, não posso reclamar. Nunca imaginei que ganharia o que ganho hoje.
Já ficou rico?
Não. Se daqui a cinco anos eu ainda estiver ganhando o que ganho hoje, vou poder dizer que fiquei rico. Mas eu não sei até quando dura isso.
É verdade que você pensou em ser pastor quando era da Igreja Batista, na adolescência? Essa função tinha semelhanças com a de fazer comédia stand-up?
As primeiras comédias que eu fiz foram no púlpito. Eu pregava muito, queria muito ser pastor. De verdade. Achava que estava fazendo uma boa coisa. E todas as pregações que fiz tinham comédia, eu sempre botava piada no meio do sermão.
Piada no sermão? Conta uma.
Eram várias. Uma vez fiz uma porque pastor é muito folgado: se um padre vai ao cabeleireiro e o barbeiro corta o cabelo dele de graça, no outro dia com certeza esse cara vai encontrar um pão na porta do salão dele. Se for um rabino e cortarem o cabelo dele de graça, no outro dia o rabino vai deixar um vinho pro cara. Agora, se um pastor souber que o cabeleireiro corta o cabelo de graça, eu tenho certeza que no dia seguinte o cabeleireiro vai encontrar uma fila de pastores na porta dele.
O que você acha do crescimento das igrejas evangélicas, das acusações de lavagem de dinheiro, do dízimo?
Um dos motivos pelos quais eu deixei a igreja evangélica foi o dízimo. Essa é uma das coisas que mais me revoltam, é uma d as piores coisas que existem, é quase um crime.
Você não tem medo de apanhar dos evangélicos depois dessas declarações?
Eu já apanhei dos evangélicos! [Risos.]
Quando foi isso?
Na Marcha para Jesus, em 2008. Na verdade, já apanhei dos evangélicos duas vezes. A primeira foi em um show da [Igreja Apostólica] Renascer, quando eu tinha 18 anos e ainda era da igreja. Eu era muito contestador. Tinha esse show que chamava S.O.S. da Vida, que serviria para “evangelizar”, ou seja, para levar mais gente para a igreja. E custava 15 reais para entrar. Eles queriam que a gente levasse mais gente para a igreja e ainda nos cobravam pelo show? Então eu e meu amigo fizemos uma faixa de 7 metros e escrevemos “$.O.$. da Vida”. E pulamos o muro para não pagar. Durante o show, o Estevam Hernandes [fundador da Renascer] começou a falar: “Levantem as faixas, vamos ver! Olha aquela lá, que grandona. Levantem aí”. Era a nossa. Levantamos, e ele, todo animado, começou a ler. Quando ele entendeu o que era, ficou puto, mandou abaixarmos a faixa e mandou todo mundo que estava perto da gente rasgar nossa faixa. O chão era daqueles de pedrinhas, e ele falou: “Quem estiver perto joga pedra neles!” E eles começaram a apedrejar a gente mesmo!
E essa história da Marcha para Jesus?
Foi uma das primeiras reportagens que eu fiz para o CQC. Um dos evangélicos viu que eu era do CQC e pulou no meu pescoço dizendo que eu não ia mais poder falar nada ali. Fanatismo, igual a petista. E começou a me empurrar e dar tapa. Essa parte não foi pro ar porque o intuito da matéria não era mostrar barraco.
Você não tinha uma espécie de prazer sádico em ver pessoas como o ex-presidente Itamar Franco sendo torturadas no quadro Repórter Inexperiente?
Eu preciso confessar que me diverti muito fazendo essas entrevistas. Talvez tenha, sim. É o mesmo prazer sádico de quando você vê o Jerry batendo na cabeça do Tom com um martelo.
No ano passado, você se envolveu em uma polêmica por ter feito a seguinte piada no Twitter: “King Kong, um macaco que, depois que vai para a cidade e fica famoso, pega uma loira. Quem ele acha que é? Jogador de futebol?” Foi uma piada racista?
Não! Eu falei de jogador de futebol que pega loira, eu não tinha falado de cor do jogador. Na mesma hora recebi uma enxurrada de reclamações. E é uma constatação da realidade: eu não inventei que ele faz isso. Jogador de futebol famoso realmente vem pra cidade grande e pega loira. É senso comum.
Tem algum grupo ou tema com que você não faça piada?
Não, tabu é coisa que quem cria é a sociedade. O humorista não tem de se preocupar com tabu. Pelo contrário, ele tem de ser o cara que afrouxa esses limites.
Hélio de la Peña, do Casseta & Planeta, disse que sua piada não teve graça.
Aí, tudo bem, ele tem direito. Aliás, acho que isso é a única coisa que se pode fazer com uma piada: achar graça dela ou não. Não dá pra ficar cagando regra em cima.
O Casseta & Planeta tem graça?
Já teve muita graça, mas hoje não mais. Quando eu era moleque, adorava. Eu ia pra escola no dia seguinte comentando o programa que tinha visto. Hoje, acho que está acomodado.
Desde esse episódio das acusações de racismo, você toma mais cuidado de alguma forma?
Eu não posso tomar cuidado. Minha profissão é falar merda, entende? Se eu for começar a tomar cuidado, vou trabalhar num escritório. Outro dia fiz uma piada sobre a Hebe Camargo e publicaram em algum lugar que eu tinha feito “um comentário de mau gosto” sobre ela. Quem é essa pessoa pra dizer o que é mau gosto?
Como se explica o sucesso de programas de humor de bordão e duplo sentido, como o Zorra Total, que está há mais de dez anos no ar?
É aquele tipo de humor que mais de 20 pontos no Ibope gostam de ver. Não é o humor que me atinge, mas atinge muito mais gente do que o humor que eu faço. A televisão investe milhões em pesquisa, a Rede Globo sabe que o público quer ver isso. E o Zorra Total passa no sábado à noite, que é quando tem muita gente desse público vendo televisão, muita gente mais velha que não sai de casa. É o que o povo gosta.
O CQC tem alguma espécie de código de ética, algum assunto com o qual vocês não mexem?
Nunca me disseram: “Danilo, vai lá, mas não fala isso ou isso”. Eu vou e faço o que deve ser feito, de acordo também com o produtor, porque eu não tô lá sozinho. Mas o CQC passa na televisão aberta. Minha responsabilidade acaba quando eu entrego a reportagem. Depois tem a responsabilidade da edição, do diretor. E ele responde pra várias pessoas, pra patrocinador, pra emissora.
Dá para ser engraçado fazendo “humor do bem” [gênero defendido pelo apresentador Marcos Mion em seu programa, Legendários, no qual, segundo ele, se ri “com as pessoas, e não das pessoas”]?
Não, isso não existe. Todo humor tem um alvo. O alvo pode ser uma ideia, uma pessoa, um lugar, mas, sempre que você fizer humor, alguém vai se levar a sério e vai reclamar. Se eu fizer humor com o meu carro, que é um Celta, alguém vai dizer que eu não posso falar mal do Celta. Todo humor tem, sim, sua carga de “mal”. Não existe piada sem alvo.
Você disse em uma entrevista ao UOL que sente “vergonha alheia” quando assiste a Legendários. É tão ruim assim?
Eu achei. E eles inventaram uma história de que nós estaríamos em guerra com eles. Não existe isso! Minha opinião simplesmente é: não acho engraçado. Isso não quer dizer que eu odeie os caras ou que eu odeie o que eles fazem. Eu só não acho graça.

E o que fez você recusar a proposta que lhe fizeram para integrar o elenco do programa?

Quando eu vi a proposta final, mandei um e-mail para eles explicando que não me via fazendo o programa por causa de várias coisas: o formato, o conceito, o figurino. Preferi continuar onde estou, que é muito mais a minha cara. Agradeci o convite, mas disse que não acreditava no projeto e que não combinava comigo.
Fala a verdade, você não quis fazer escada para o Mion…
Eu não tenho problema nenhum em ser escada se eu acreditar na ideia e for pra dar risada. Uma vez entrevistei a Marília Gabriela e ela ficou muito ressabiada comigo. Eu fiz uma pergunta, uma piada, e ela me respondeu à altura, me deu uma na cabeça. E ali eu não continuei porque percebi que o público ia rir, então fui escada dela. Se eu servi de escada e teve uma risada boa, está perfeito.
O CQC daria certo na Globo?
Acho que sim. O CQC deu certo no Brasil e em todos os países em que foi feito. É um produto testado e aprovado, então não vejo por que não funcionaria na Globo. Mas acho que o CQC tem um charme a mais por estar na Band. Fica uma coisa mais cult, quase marginal. Acho que o fato de estar na Band tem muito a ver com o espírito do programa. São os caras que começaram pequenos e foram crescendo.
Você sabe quantos pontos o CQC dá no Ibope?
Não.
Alcança 6 pontos em média, ou cerca de 3 milhões de espectadores. Você não se preocupa com os níveis de audiência?
Não. O diretor sempre nos disse que o Ibope não nos interessa. Até porque a gente já fez ótimos programas que deram pouca audiência e outros que a gente não achava tão legais e foram muito assistidos.
Você disse em uma entrevista que o humor brasileiro precisa se renovar, não só na televisão, “mas no próprio brasileiro”. Brasileiro não tem senso de humor?
Acho que não. Por exemplo, se eu vou fazer humor na convenção da Dilma, o pessoal que está lá começa a ficar puto. Mas, quando eu fiz na convenção do Serra, essas mesmas pessoas adoraram. Então, acho que o brasileiro se leva muito a sério. E isso, na minha opinião, tem a ver com autoestima. Brasileiros têm a autoestima muito frágil e, por isso, se ofendem muito facilmente. Você precisa ter personalidade e ser muito seguro para conseguir rir de si mesmo. Quando um brasileiro vai fazer uma piada, ele fala da loira. É a loira que é burra. O brasileiro nas piadas nunca é burro.
Você já teve pesadelos em que estava diante do público e ninguém ria?
Não, isso aconteceu na vida real mesmo. No começo, acontecia muito.
Qual foi a pior piada que você fez na vida?
Acho que foi uma piada que fiz no meu show e absolutamente ninguém riu. Era Dia dos Pais, e eu falei: “Meu pai morreu, mas, se hoje ele estivesse aqui me vendo, eu diria: ‘Nossa, um fantasma’”. Ninguém riu, ficou o maior climão, e fudeu o show inteiro. [Risos.]
Hoje em dia, nas apresentações de stand-up, você sente a plateia mais predisposta a rir porque você é um cara famoso?
Não, hoje é bem mais difícil. A piada que te faz rir é aquela que te surpreende. Antes, quando eu vinha de Santo André, subia no palco e ninguém me conhecia, ninguém esperava nada de mim. Era muito mais fácil surpreender. Hoje já esperam que eu seja engraçado, e eu tenho de criar coisas novas sempre. É tipo: “Vamos ver se esse cara é engraçado mesmo”. Nunca me vaiaram, mas acho que eu ainda prefiro ouvir a vaia a ouvir o silêncio.
O stand-up não virou uma coisa meio banalizada, perto da saturação?
Sim. E era natural que isso acontecesse. O próximo passo é a peneira. Porque isso não existia aqui antes e, quando começou, nenhum bar queria nos dar espaço. Para eles, a gente era o cara chato tentando fazer piada. Hoje em dia, se o cara é bom, ele vai fazer um show e vai conseguir público.
Por que há tão poucas mulheres fazendo humor no Brasil?
Vou cagar regra agora: humor é algo tão subjetivo que são poucas coisas que se pode afirmar com certeza, mas, quanto a mulheres, acho que tem muito a ver com a vaidade. Não é uma regra isso, é minha opinião de observador. É muito fácil achar um cara que não tem pudor de subir ao palco e falar que o pau dele é pequeno, por exemplo, mas é muito difícil arranjar uma mulher que faça graça com o culote dela. Acho que a vaidade feminina é o que faz com que haja mais homens fazendo humor. Já li que o humor é uma ferramenta que o homem desenvolveu para conquistar a mulher. Elas não precisam fazer o cara dar risada, usam outros artifícios. Se o homem consegue fazer a mulher rir, é meio caminho andado.
Você disse, em uma entrevista ao João Gordo, que a primeira vez que viu uma mulher pelada foi na internet. É sério isso?
Não, foi na PLAYBOY. E eu já tinha visto a filha do pastor também, na minha casa. [Ri, constrangido.]
Conta essa história direito.
Uma vez ela me chamou para os fundos da igreja e disse: “Vem aqui. Vou te mostrar um negócio”. Eu fui e, quando cheguei lá, ela levantou a blusa. Aí eu falei: “Se vai mostrar, mostra direito”. Aí ela abaixou a calça. A gente devia ter uns 17 anos. E ela ia à minha casa também. A gente brincava, mas não passava disso. Ela queria, mas eu achava que não era certo. O pastor nunca soube, e acho que nem vai ficar sabendo porque ele não deve ler a PLAYBOY. Ou lê, vai saber…
E sua primeira vez, quando foi?
Ah, demorou. O que aconteceu é que eu entrei pra igreja e, quando saí de lá, tinha uns 20 ou 21 anos. E comecei a namorar uma menina que não queria transar comigo, queria casar virgem.
Você também queria se casar virgem?
Eu não tava nem aí. Nessa época eu já tinha tomado tanta porrada de todos os lados que estava muito passivo. Fiquei três ou quatro anos com essa namorada, até que fiquei de saco cheio e terminei, mas não por causa da falta de sexo.
Você ficou virgem todos esses anos?
Fiquei.
E você quer que eu acredite nisso?
Pode acreditar. Eu era virgem, não consumava as coisas de fato, mas algumas coisas aconteciam, né? E, depois que terminou eu saí comendo todo mundo. A primeira vez foi com uma menina do Rio de Janeiro que queria sair comigo havia algum tempo. Eu tinha uns 24 ou 25 anos. Foi legal, mas já tive melhores. [Risos.]
Alguma fã já passou dos limites com você?
Teve uma que faltou com o respeito, e eu fiquei puto. A menina hackeou o meu e-mail. Ela mandou algum spam em que eu cliquei e caí.
Tipo “Enlarge your penis”?
Não. [Risos.] Nessa eu não caio porque sei que não funciona; senão, eu cairia. Acho que foi alguma coisa tipo “gravaram seu show e puseram na internet”. Eu cliquei no link, e não tinha nada. Na hora, eu pensei: “Fudeu”. E lá tinha várias informações de trabalho e informações pessoais. Fui pra delegacia. Tô esperando pra ver se dá alguma coisa.
Você está satisfeito com sua vida de solteiro?
Tô. Eu não quero casar logo, é muito chato. Eu tenho problemas de relacionamento. O que acontece é que geralmente não confio em uma mulher que toparia namorar comigo, já acho que tem alguma coisa errada com ela. Só tive uma namorada na vida.
Você já transou com fãs?
Já, né? Mas elas também transaram comigo.
Como é que rola isso?
Tem de tudo. Eu recebo e-mails de fãs que dizem: “Danilo, é o seguinte: eu não quero namorar, não quero casar, só quero dar pra você”. Geralmente eu nem respondo, mas… [Pausa.] Às vezes eu respondo. [Risos.] É que, quando eu vejo que a mina quer muito dar, eu falo: “Ah, tá bom, né?” Se fosse eu, e quisesse muito comer, não ia gostar se ela ficasse regulando.

Então você é do tipo “fácil”?

Sou muito fácil. Só vou ser difícil depois que casar. Minha vida já é muito difícil; então, por que vou dificultar uma coisa boa?
Você costuma pegar muita mulher fazendo piada?
Muita. Mas tem de ser uma coisa espontânea e sob medida, não pode ser piada pronta.
Você já broxou?
Eu? Muitas vezes! [Risos.] E já dormi em cima de uma mulher no meio do sexo. Eu estava muito cansado, tinha trabalhado o dia inteiro. Quando acordei, ela não estava mais lá.
E tem piada que funcione quando você falha na hora H?
Não precisa nem fazer piada. Se você falar que broxou, a mulher já dá risada.

Mas há algo que você pode fazer, digamos, para remediar a situação?

Um profissional sempre precisa ter uma piada na manga em caso de emergência. Se, por exemplo, na hora H você broxar, você é o alvo da piada da vez. Não pense duas vezes, mande esta: “Bem, pelo menos não transamos, o que seria um vexame bem maior pra mim!”


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